segunda-feira, 27 de junho de 2011

"... Somos todos escravos do que precisamos reduz as necessidades se queres passar bem que a dependência é uma besta que dá cabo do desejo a liberdade é uma maluca que sabe quanto vale um beijo."
Jorge Palma


Pecar ou não pecar, eis a tentação.

Foi em 2008 a altura em que mais brinquei com as palavras. Apaixonei-me. Não queria muito mais da vida, senão afagar-lhe o olhar despenteado.
"That is all about the heart"- sabiamo-lo. Um dia dei por mim a apalpar o coração em chamas: in(senti)-o ou incêndio? Nesse dia descobri coisas novas, coisas estranhas, como o facto da paixão saber a sushi com chantilly. Que o sentimento é uma festa brava e que é possível gostar de alguém à desgarrada.
Naquela altura só queria perder-me com ele, o tal que subtilmente me tinha arrancado o coração e que o passeava ao peito, espetado num alfinete, a servir de pregadeira. Ele não sabia nada de nada e acredito que nunca chegou a perceber que o coração não se usa do lado de fora do peito. Lamentei-o na altura.
Vivíamos num balancé: ora ele no alto a pintar de azul o céu a lápis cyan, ora eu com os pés no chão, à procura do impulso que me deixasse chegar lá. Mas andámos sempre desencontrados à custa do maldito equilíbrio e quando, finalmente, subi e toquei nos castelos que construímos nas nuvens, ele estava com os pés no chão. Quando lhe perguntei "queres fugir comigo?", ele fugiu.
Durante muito tempo acreditei que não há amores vazios. Nem maus amores. Nem tão pouco amores mal resolvidos. Muito menos amores acabados. Há amores incompletos. E, nessa altura, não queria mais senão completar o guião, agarrar no comando da minha vida como num comando electrónico e passar todos os capítulos em frente, na expectativa de um final feliz. Do final feliz que me convinha.

"Ele não é o homem da tua vida. Se o fosse, reconhecer-te-ia. E não te deixaria escapar." - diziam-me as pessoas. Quando temos o coração em pedaços ( e, sim, é sempre o coração) as pessoas não sabem rigorosamente nada. Especialmente do meu coração, que é um pega-monstros.
Pensei em bifurcar o meu coração. Ou em alternativa, enforcá-lo. Tirar-lhe o ar e o sol que lhe alimenta os batimentos, completamente tontos de tanto centrifugar. Como se uma varinha mágica os moesse e triturasse, até ficar um líquido denso e homogéneo, tão misturado que nada ali se consegue identificar. Até que numa noite de Inverno sentei-me e vi o que tinha restado. A paixão estava-me tão grande que a deixei arrastar-se pelo chão durante meses seguidos, na esperança que a calçada e as solas dos sapatos (os mesmos que a pontapeavam) a desgastassem. Aos poucos, lentamente, comecei a esvaziar-me dele. Senti-o despreenchendo-me. Desenchendo-me. Até que percebi que não me restava nada mais senão fazer uma baínha. E peguei numa agulha e linha, enfim. Dei por mim a descobrir o tudo que podia fazer com esta divisão ampla e espaçosa que foi ficando. A habitar, finalmente, um coração remodelado e equipado com os mais modernos sentimentos e as mais tecnológicas emoções. Acabamentos de luxo. Estar só, livre daquele sentir obsessivo, e sentir-me em casa. Cheia de mim. "That was all about the heart". 

Da brilhante Pólo Norte.

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